Eu era piquinininho quano morava na roça
ca minha mãe, co meu pai, cos seis irmão
na paioça.
Acordava bem cedinho, antes do galo
cantá,
e isperava o sór nascê, pa dispois mi
alimentá.
Memo coa pança istufada, eu corria bem
ligero
pa dá mio pas galinha e pos porco no chiquero.
Quano cabava o trabaio eu brincava co
Totó,
o cachorro vira-lata que ganhei da minha
vó.
Dispois, deitado no chão, eu oiáva os
passarinho
que avuava na manguera, pa cuidá dos
fiotinho.
Eu tamém gostava muito de brincá co meus
irmão:
pega-pega, esconde-esconde, bola de
gude, pião...
Tempo bão... inté qui um dia meu pai disse
assim: “Meu fio,
já arrumei as suas mala, e num quero ovi
um pio.
Eu quero ocê na cidade, cos miores professô.
Istude, meu fio, istude, inté ocê virá dotô”.
Foi co lágrima nos zóio, que fui embora
dali
dexano minha famia e o lugá onde nasci.
Veno os meus zóio vermeio, durante toda
a viage,
a madrinha me abraçava e me dizia:
“Corage”.
Quano cheguei na cidade, oiei as casa
cumprida;
“São edifiço” - me disse, minha madrinha
querida.
Na escola sofri dimais, purque os menino
marvado
dizia que eu era burro, pois falava tudo
errado.
A fessora tamém disse, mai disse cum
todo jeito,
se eu quisesse sê dotô, tinha que falá
direito.
Desde então fui corrigindo o meu
jeito de falar.
Li muitos livros e nunca, nunca
parei de estudar.
Fui um aluno aplicado, lutei por
minha conquista,
e, como meu pai previa, sou doutor:
cardiologista.
Os meus pais não sofrem mais com a
penúria da roça;
e eu, sou o mesmo menino que morava
na palhoça.
Com cada gesto pretendo semear só
coisas boas,
e, assim, inundar de amor o coração
das pessoas.
Maurício Cavalheiro
(in: Voo inaugural: poesia a oito
mãos)
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